“É que surgiu um imprevisto…”

Ouvi essa frase ontem, de uma paciente que, horas antes, ao telefone, relatava fortes dores. A frase foi usada para justificar, 5 minutos antes da consulta marcada, que ela não poderia comparecer ao compromisso acordado. “Apenas” mais um cano como muitos que eu e você, prezado colega cirurgião-dentista, estamos acostumados a levar.

Porém, nem era minha paciente propriamente dita. Não nesse caso, pelo menos. Ela passou por uma remoção cirúrgica de 3o molar no meu consultório, em dezembro, realizada por um colega meu que é cirurgião bucomaxilofacial. Entrei em contato com ele, num dia em que eu não viria ao consultório até então, e perguntei se ele poderia atendê-la. Ele cancelou alguns compromissos e veio especialmente para vê-la… afinal, ela sentia dor. Eis que, momentos antes do nosso encontro… a fatídica ligação.

É fato: imprevistos acontecem. Estamos à mercê deles. Neste caso específico, não fui informada do tipo de compromisso que cancelou nossa consulta. Fico imaginando, inevitavelmente, que tipo de imprevisto é mais importante que uma dor pulsante. O pai na forca?

Os pacientes não fazem ideia do transtorno que causam quando cancelam suas consultas em cima da hora, ou quando, simplesmente, não aparecem. A paciente do meu relato ligou avisando que não viria. Mas não havia nada mais a ser feito naquele momento, a não ser esperar a chegada do meu colega e pedir desculpas a ele.

Nós, dentistas, somos profissionais liberais. Ou seja, a maioria de nós não trabalha naquele regime de um número determinado de horas por dia, com salário fixo no final do mês. Para nós, o ditado “tempo é dinheiro” não é só um adágio popular… é a nossa rotina. Como trabalhamos com hora marcada, nosso tempo é reservado para cada paciente em especial. Quando o paciente não aparece, ficamos ociosos. Quando ficamos ociosos… tuitamos! 😀

Os pacientes costumam ficar bravos quando atrasamos o atendimento deles. Afinal, “eu já estou aqui esperando há 10 minutos!”… e, devo reconhecer, eles têm toda razão. Atender no horário é uma questão de respeito. O tempo dele é precioso, assim como o nosso. Tem colega que marca paciente a cada 10 minutos… a chance de atender a cada um deles no horário certo é quase nenhuma. Veja, cada profissional sabe do tempo clínico que precisa…. mas um pouquinho de “tempo de manobra” não faz mal, né?

Porém, para os casos de atraso, nós temos algumas “desculpinhas” bem aceitáveis… 🙂

–> Os encaixes: são os pacientes de emergência. Na Odontologia, as emergências costumam ser ligadas à dor e à estética. Dor eu não preciso nem explicar. Estética pode ser quando, por exemplo, a pessoa perde a prótese do dente da frente. Tem que fechar o 1001, né?! E tem que ser AGORA.

–> Complicações durante o procedimento: aquele dente que estava “pulando para fora” deu mais trabalho do que parecia que ia dar. Acontece. Ou pior: sem motivo aparente que conste na anamnese, o paciente não pára de sangrar. Vai mandar ele pra casa “pingando” porque é a vez do próximo?

–> Dependência de outros profissionais: o protético. O protético é o cara que devia ter entregado aquela dentadura há meia hora. Mas ele não entregou. E o paciente está na sala de espera, puto. Com o dentista.

–> O atraso dos outros pacientes: sua consulta era 14:00h. Mas você chegou 14:15h. Os 15 minutos em questão foram “tirados” do próximo paciente, o que gerará um efeito cascata que fará a agenda do seu dentista entrar em combustão espontânea. Se o dentista disser para os outros pacientes que a culpa é sua, inevitavelmente ouvirá: “Por que atendeu se ele estava atrasado?”. Mas se os atrasados forem eles… “é só 15 minutinhos, doutor! Dia desses esperei por você mais de meia hora!”.

Para o bem da nossa relação, por favor prezado paciente:

–> Se você sabe que não poderá vir, não marque a consulta “só pra garantir” seu lugar na agenda.

–> Se você não sabe se poderá vir no momento de marcar a consulta, não marque. Aguarde ter certeza. Ou pelo menos, quase.

–> Se você não pretende aparecer, não confirme sua presença quando a secretária ligar perguntando se você vem.

–> Se realmente precisar faltar, ligue avisando. E isso deve ser feito com, no mínimo, 1 dia de antecedência. Outros pacientes estão doidinhos por aquele horário que nós reservamos só pra você…

–> Você não é de açúcar. Chuva, a não ser que você more em algum morro com perigo de vir abaixo, não é motivo pra faltar.

–> Chegue com uns 5 minutinhos de antedência. E conforme-se: talvez você tenha que aguardar.

Seguindo esses conselhos, todos seremos mais felizes. Eu serei :). Quanto ao caso que relatei, a paciente volta hoje. Ou não… afinal, imprevistos acontecem 🙂

UPDATE: Acreditem, não é piada. A paciente me ligou no horário exato da consulta, desmarcando.

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Categoria: Profissão: Cirurgião-Dentista

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13 comentários

  1. Concordo plenamente com o post, bastante realista – se um horário é marcado e você está “ocupando” aquele espaço de um profissional tem de ter respeito e responsabilidade para cumpri-lo. Mas gostaria de colocar também a posição do paciente quando tem de esperar até 1 hora pela chegada do profissional… já aconteceram comigo 2 “intercorrências” do outro lado – ou seja – uma vez agendei o primeiro horário da manhã (7h) e tive de esperar até 8h15. E numa outra vez a profissional já estava no consultório e meu horário era às 18h30, estava aguardando a saída do outro paciente na sala da espera quando chegou uma outra médica. Assim que o paciente saiu, ela entrou e simplesmente ficaram sentadas conversando por 40 minutos (como o consultório era de vidro jateado, percebi que não se tratava de qualquer caso de urgência médica) – então me levantei e me retirei. Quando estava quase chegando no elevador a secretária veio correndo dizendo que a médica me atenderia naquele momento, mas aí ficou claro a total falta de profissionalismo e fui embora.

  2. >Só li o post agora, pois hoje inacreditável não levei nenhum bolo… Mas geralmente não é assim, sempre há um imprevisto… Uns avisam na hora da consulta ou 5 min antes e outros nem isso…
    Como a Kellen disse: Valeu a pena esperar!!!
    Excelente texto!!!
    Beijinhos =]

  3. >Muito bacana o Post e deve ser por isso que estou engordando… de tanto bolo que eu levo! Eu tenho essa consciência e nas minas consultas com médicos, fisioterapeutas e etc eu sempre aviso com antecedência caso eu precise faltar ou mudar o horário. As pessoas não fazem a mínima noção de como é difícil não atrasar e cuidar de uma agenda diária. Tem secretária que enlouquece. Juro. Acho que quando os pacientes são do convênio, o desrespeito por parte deles é ainda maior, pois parece que na cabeça deles, funciona assim: eu pago o convênio todo mês, então o dentista tem que estar lá a hora que eu quiser. Não é bem assim, pessoal! Ontem levei 2 canos das minhas únicas pacientes marcadas, portanto não trabalhei ontem, portanto não ganhei um tostão furado.

  4. >Extremamente oportuno. Os "bolos", infelizmente, vivem acontecendo no consultório. Por mais que a gente fale para o paciente, às vezes fica a impressão de que só os horários deles têm importância. Mas já deixei de atender paciente que não compareceu no horário e queria um "encaixe". Nesse caso, funcionou. Nunca mais chegou atrasado, pelo contrário!

    Enquanto isso, vai tuitando aí enquanto o paciente não aparece! 😛

  5. >Muito pertinente!
    A falta dos pacientes sem aviso prévio é de fato um incômodo muito grande. No consultório onde trabalho, costumamos cobrar falta dos pacientes que já estão em tratamento, e eles são avisados disso desde o início. Só não adianta muito quando a falta é na consulta de exame..!
    Tomara que sua paciente não tenha faltado por medo do dentista! 😛

A área de comentários / perguntas está fechada. Agradeço a compreensão.

No plantão: Ana Tokus

Cirurgiã-dentista graduada pela Universidade Federal do Paraná, especialista em Radiologia Odontológica e Imaginologia pela ABO-PR, convicta de que medo de dentista se combate (também) com informação. Diva-Boss do OdontoDivas e autora do Blog Raios Xis. Twitter: @AnaTokus e @medodedentista